O fim das férias e o lápis azul de unicórnio com a borracha lilás na ponta

Mãe, Quero suco. Tem morango? Você viu meu lápis azul de unicórnio com a borracha lilás na ponta?

- Claro que sim, filha, é óbvio que sei exatamente onde está seu lápis azul de unicórnio com a borracha lilás na ponta.

- Onde?

- Como eu vou saber?

- Mas você disse que sabia.

Depois de 1645 dias de férias, hoje é a tão esperada (por mim) volta às aulas e se eu fechar meus olhos, já quase escuto o som do silêncio.

- Maaaaaaaaee! A Nina derrubou suco no uniforme.

- Quase, eu disse.

- Tudo bem, foi só uma gotinha. - Digo tentando secar com um guardanapo a gola completamente encharcada de suco de uva.

- Mas eu vou pra escola sem o meu lápis azul de unicórnio com a borracha lilás na ponta?

Neste momento eu já estou me perguntando por que não deixamos tudo pronto no dia anterior.

- Tira essa sandália e coloca um tênis. E não, não pode usar sombra de glitter pra ir pra escola.

- Por que tem banana na minha lancheira? Hoje eu não gosto nunca mais de banana!

Antes de eu terminar de entender aquela frase já estamos atrasadas. 2 mochilas, 4 reclamações e 1 choro e meio depois, estamos nós nos despedindo na porta da escola. É quando a porta se fecha que eu me arrependo de não ter procurado melhor o lápis azul de unicórnio com a borracha lilás na ponta. Mas mesmo assim entro no carro tentando sentir a liberdade de finalmente estar só. Posso escolher a música que eu quiser, mas não encontro nenhuma que eu queira mais do aquela que cantamos juntas sempre que andamos de carro. Só que agora canto quase sozinha: só uma lágrima me acompanha.

Volto pra casa, sozinha, o silêncio é tanto que escuto até o vazio dentro de mim. Abro a porta e vejo, sobre a mesa, o lápis azul de unicórnio com a borracha lilás na ponta. Ali, sozinho, me olhando como quem me desafia: vai fazer o que com seu tão sonhado silêncio?

É com ele, com o lápis azul de unicórnio e borracha lilás na ponta que escrevo essa crônica, torcendo para que o relógio se apresse e eu possa buscá-las logo na escola. Escrevo prometendo amanhã não reclamar do barulho e da bagunça, mas completamente consciente de que vou acordar querendo que a hora de levá-las pra escola chegue logo.

Gisele Moreira